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A chuva 373j6w


Publicado em 13 de junho de 2025 Por Jornal Do Dia Se 236d5m


* Lelê Teles

 

Fez sol o dia inteiro, deu praia.
Aproveitei pra dar uma cochiladinha depois do almoço e das caipirinhas.
Desperto e vou à varanda ver o vento ventar, o cenário é outro.
O céu, negro como um corvo, parece pesado.
Ouço um barulho vindo de longe e se aproximando rápido, parece aplausos.
Logo percebi que era água gritando nos telhados.
Do nada, cai uma chuva grossa e barulhenta.
Parece que o mundo vai desabar sobre minha cabeça.
Venta forte, relampeia, troveja…
Na rua, mulheres dão gritinhos e correm apressadas, com seus vestidos colados no corpo.
Um motoqueiro, com uma caixa nas costas, desiste da entrega e se entrega ao abrigo de uma marquise.
Foda-se se o cara tá com fome, é preciso uma arca pra navegar nesse dilúvio, a pop cem dele não tem a menor chance.
A vizinha do lado bate a porta da varanda com toda força e espragueja palavras impronunciáveis.
Imagino que ela tenha acabado de gastar cem dólares no salão pra dar uma ajeitada na peruca.
Perdeu tudo.
De repente, um raio rasga o céu negro, formando raízes elétricas e luminosas no firmamento.
Agora vem a explosão, puuummmmmm, como se fosse um grande deus arrotando lá de cima.
O edifício inteiro treme, é difícil não se assustar.
“Minha nossa senhora do perpétuo socorro”, gritou a vizinha da frente, em desespero, “desliga a tomada da geladeira, minina”, gritou pra dentro de casa.
O diabo deve estar sorrindo dessa satanagem, isso aqui vai virar um inferno em poucos minutos, é muita água!
Os canais vão transbordar, jogando uma fétida água com fezes no meio da pista.
Em pouco tempo, penso com os meus botões, as ruas estarão alagadas e o tráfego interrompido.
Tem uma igreja Quadrangular aqui na frente, a tempestade caiu bem na hora em que os crentes costumam chegar com suas bíblias no sovaco.
O pastor, claro, deve estar orando em línguas, tentando sabotar a chuva.
Jesus costumava fazer isso, mas o fazia em aramaico.
E com ele dava certo.
Ora, ora ora, mas o que está acontecendo aqui?
O vento parou de ventar e, subitamente, a chuva arrefeceu.
Parece que foi uma daquelas tempestades repentinas e fugazes.
Ou teria sido o desgraçado daquele pastor impostor interferindo no tempo?
Com mil diabos, não é que a chuva parou de verdade!
Tava tudo tão lindo, os raios, os trovões, o dilúvio, as mulheres com as roupas coladas, o entregador lanchando o lanche que deveria ter entregado…
Eu gosto da confusão que a chuva provoca, mães correndo pros varais, em desespero, um bater de portas, um fechar de janelas.
Todo mundo apavorado com o imponderável, o corre-corre, a confusão, os semáforos sem sinal…
E de repente isso, essa calmaria, esse rame-rame católico.
O motoboy partiu, os crentes começam a chegar.
Aquele pastor idiota estragou a minha chuva, é por isso que Deus não gosta desses caras.
Palavra da salvação.

 

* Lelê Teles, jornalista, publicitário e roteirista

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